segunda-feira, 27 de agosto de 2012

DA CERTEZA DA GRAÇA E DA SALVAÇÃO


I. Ainda que os hipócritas e os outros não regenerados podem iludir-se vãmente com falsas esperanças e carnal presunção de se acharem no favor de Deus e em estado de Salvação, esperança essa que perecerá, contudo, os que verdadeiramente crêem no Senhor Jesus e o amam com sinceridade, procurando andar diante dele em toda a boa consciência, podem, nesta vida, certificar-se de se acharem em estado de graça e podem regozijar-se na esperança da glória de Deus, nessa esperança que nunca os envergonhará.

II. Esta certeza não é uma mera persuasão conjectural e provável, fundada numa falsa esperança, mas uma infalível segurança da fé, fundada na divina verdade das promessas de salvação, na evidência interna daquelas graças a que são feitas essas promessas, no testemunho do Espírito de adoção que testifica com os nossos espíritos sermos nós filhos de Deus, no testemunho desse Espírito que é o penhor de nossa herança e por quem somos selados para o dia da redenção.

III. Esta segurança infalível não pertence de tal modo à essência da fé, que um verdadeiro crente, antes de possuí-la, não tenha de esperar muito e lutar com muitas dificuldades; contudo, sendo pelo Espírito habilitado a conhecer as coisas que lhe são livremente dadas por Deus, ele pode alcançá-la sem revelação extraordinária, no devido uso dos meios ordinários. É, pois, dever de todo o fiel fazer toda a diligência para tornar certas a sua vocação e eleição, a fim de que por esse modo seja o seu coração no Espírito Santo confirmado em paz e gozo, em amor e gratidão para com Deus, em firmeza e alegria nos deveres da obediência que são os frutos próprios desta segurança. Este privilégio está, pois, muito longe de predispor os homens à negligência.

IV. Por diversos modos podem os crentes ter a sua segurança de salvação abalada, diminuída e interrompida negligenciando a conservação dela, caindo em algum pecado especial que fira a consciência e entristeça o Espírito Santo, cedendo a fortes e repentinas tentações, retirando Deus a luz do seu rosto e permitindo que andem em trevas e não tenham luz mesmo os que temem; contudo, eles nunca ficam inteiramente privados daquela semente de Deus e da vida da fé, daquele amor a Cristo e aos irmãos, daquela sinceridade de coração e consciência do dever; dessas bênçãos a certeza de salvação poderá, no tempo próprio, ser restaurada pela operação do Espírito, e por meio delas eles são, no entanto, suportados para não caírem no desespero absoluto.

Confissão de Fé de Westminster - Capítulo XVIII.

terça-feira, 3 de julho de 2012

POSICIONAMENTO DA IPB SOBRE O MOVIMENTO DE IGREJAS EM CÉLULAS

Na última Reunião Ordinária da Comissão Executiva do Supremo Concílio da IPB, ocorrida em março/2012, a denominação se posicionou em relação ao movimento de Igrejas em Células, considerando este movimento divergente da fé bíblico-reformada. Este movimento tem encontrado largo espaço em diversos presbitérios e igrejas presbiterianas por todo o Brasil. Já estava na hora. Queira Deus que as igrejas e presbitérios que têm aderido a este movimento recuem, em nome da preservação da eclesiologia bíblico-reformada. Leia o posicionamento oficial:

SUBCOMISSÃO IX - CONSULTAS E OUTROS PAPÉIS II - CE-SC/IPB-2012 - DOC.CLXI - Quanto ao documento 038 - Oriundo do(a): Sínodo Piratininga - Ementa: Consultas sobre Igrejas em células.

Considerando: 1. Que o movimento das “igrejas em células“ tem características próximas ao movimento G12, já rejeitado pela IPB conforme resoluções da CE-SC/IPB-2000 - Doc XCIX; CE-SC/IPB-2001 - Doc. XLI e SC-IPB-2002 Doc. CXXII; 2. Que a terminologia empregada pelo movimento de “igrejas em células“ é semelhante ao do movimento G12, a saber, “ano de transição“ e “celularização da igreja“, 3. Que a prática do movimento difere da eclesiologia da IPB, por exemplo, nos seguintes pontos: a) administração dos sacramentos ministrados nas células e não na igreja; b) ênfase nos relacionamentos e não no ensino; c) relaxamento da disciplina eclesiástica; d) incentivo ao não funcionamento das Escolas Dominicais. A CE-SC/IPB - 2012 RESOLVE: 1. Tomar conhecimento; 2. Informar que a igreja em células não é o mesmo que pequenos grupos, que permanecem jurisdicionados ao conselho da Igreja local, os quais têm importância na vida da igreja contribuindo para comunhão e instrução; 3. Reafirmar que as funções privativas do Conselho estão expostas no art. 83 da CI-IPB; 4. Responder ao Presbitério que o movimento diverge de nossa teologia bíblico-reformada e orientar as igrejas a não aderirem a este movimento em células ou a qualquer outro divergente de nosso sistema presbiteriano.

quarta-feira, 27 de junho de 2012

QUEM DEVE PREGAR A PALAVRA DE DEUS?

Do Catecismo Maior de Westminster Comentado


Pergunta 158. Por quem deve ser pregada a Palavra de Deus?


R. A Palavra de Deus deve ser pregada somente pelos que forem suficientemente dotados e devidamente aprovados e chamados para tal ofício.

Referências bíblicas

1) Aqueles que pregam a Palavra de Deus publicamente devem possuir obrigatoriamente certas qualificações definidas na Bíblia. 1Tm 3.2, 6; Ef 4.8-11; Os 4.6; Ml 2.7; 2Co 3.6.

2) A Palavra de Deus deve ser pregada publicamente somente pelos que foram legitimamente chamados para o ofício do ministério da Palavra. Jr 14.15; Rm 10.15; Hb 5.4; 1Co 12.28-29; 1Tm 3.10; 4.14; 5.22.

Comentário

1. Essa pergunta do Catecismo trata especialmente de que tipo de pregação da Palavra?

Trata da pregação da Palavra numa congregação da igreja de Cristo. Pode-se inferir isso das palavras “em público para a congregação” na resposta da Pergunta 156. Quem não for ministro ordenado ou licenciado pode testemunhar de Cristo em particular ou em público, conforme a oportunidade o permita, mas a pregação pública oficial da Palavra na igreja deve ser feita apenas por aqueles devidamente separados para essa obra.

2. Por que a pregação oficial da Palavra deve ser feita só “pelos que forem suficientemente dotados”?

Claro está que a pregação da Palavra é uma obra de importância muito grande. São necessárias as qualificações apropriadas para que seja feita da maneira adequada. Há qualificações espirituais, intelectuais e educacionais sobre as quais se deve insistir para que a igreja tenha um ministério adequado. Um homem que não tenha nascido de novo e que não seja um consistente crente em Cristo, não tem obviamente condição de pregar a Palavra de Deus aos outros; seria apenas um cego conduzindo outro. Um homem incapaz de pensar corretamente, incapaz de detectar a falácia de um argumento perverso, é passível de ser ele mesmo desviado por um falso ensinamento e, por sua vez, capaz de desviar outros. Um homem a quem falta educação geral e teológica normalmente não será capaz de fazer justiça à grande obra de pregação da Palavra de Deus e correrá o perigo de pregar uma mensagem desequilibrada ou parcial. Quando Deus chama um homem para a obra do ministério, também o aparelha com as habilidades e qualificações necessárias para que possa realizar a obra adequadamente.

3. Por que a nossa igreja, e a maioria das igrejas Protestantes, exige a formação superior completa num seminário para o ofício do ministério?

Quanto mais importante for a obra, mais importante será que tenham o treinamento adequado os que a realizarão. Sempre tem havido quem ache que seja perda de tempo, em maior ou menor grau, gastar sete anos na formação superior num seminário, preparando-se para a obra do ministério. Há hoje em muitas denominações a pressão constante para que essas exigências sejam relaxadas e que sejam admitidos no ministério homens que tenham menos do que isso. Alguns consideram que as matérias ensinadas em um curso superior — como filosofia, história e literatura — sejam inúteis ao ministério e uma perda do tempo que deveria ser investido “ganhando almas”. Há, da mesma maneira, quem pense que um breve “Curso de Bíblia” e mais algumas matérias práticas como a retórica religiosa (homilética) e prática pastoral devam ser suficientes e que o amplo estudo de Hebraico, Grego, História Eclesiástica e Teologia Sistemática sejam desperdício de tempo.

Ninguém que precisasse passar por uma cirurgia estaria disposto a ir a um cirurgião que obteve o seu treinamento através de atalhos. O Estado insiste, corretamente, que aqueles cujas decisões e ações envolvam a vida ou a morte de seus semelhantes estejam plenamente treinados para o exercício do seu ofício. Quão mais importante é que os ministros do evangelho, cujo trabalho pode afetar o destino eterno de seres humanos, estejam plenamente instruídos para a tarefa a eles designada. Considerando-se o espaço de tempo necessário ao treinamento na medicina e de outras doutas profissões, os quatro ou cinco anos empenhados no curso superior de um seminário não são demasiados para o treinamento ministerial.

O ministro a quem faltar o treinamento num seminário dificilmente conseguirá entender o mundo moderno ao qual tem de entregar a sua mensagem. O estudo de filosofia, história e de outras matérias acadêmicas está longe de ser uma perda de tempo. Elas apresentam o cenário do pensamento moderno e habilitam o ministro a proclamar todo o conselho de Deus de modo que confronte cabalmente a situação dos dias presentes. Semelhantemente o estudo de Grego, Hebraico, Teologia Sistemática, etc., é qualquer coisa, menos perda de tempo, pois permitem ao ministro conhecer de primeira-mão a Bíblia e seus ensinamentos, e pregar uma mensagem bíblica, consistente e integrada.

A tendência moderna de cortar os estudos “teóricos” e aumentar os estudos “práticos” na preparação para o ministério é deplorável e deve ser resistida. Existem dois tipos de seminários teológicos e institutos bíblicos. Num deles o alvo é instrumentar o estudante com uma certa quantidade de material pronto com o qual ele pode sair e ir pregar. No outro, o objetivo é colocar nas mãos do estudante as ferramentas do estudo bíblico e da pesquisa teológica e treiná-lo para usá-las corretamente. Daí, então, ele pode sair e pregar e a matéria-prima da sua pregação jamais vai se esgotar enquanto viver. Cremos que este último é que é o único e apropriado tipo de treinamento para a obra do ministério.

Não se deve entender, pelo que foi dito, que jamais haja exceções a essas regras. É óbvio que alguns dos discípulos do nosso Senhor tiveram pouca ou nenhuma educação formal, mas tornaram-se eficazes ministros da Palavra. Eles, no entanto, gozaram da inestimável vantagem de passarem três anos na companhia de Jesus sob a Sua instrução pessoal. Deus às vezes chama para o ofício ministerial um homem com pouca ou nenhuma educação formal e nesses casos excepcionais, onde está evidente a chamada divina, a igreja não deve hesitar em ordenar o candidato ao ministério. Tais casos, contudo, são muito raros, especialmente em dias em que são normais as oportunidades para a aquisição da educação. Não se deve permitir que a exceção torne-se regra.

4. Que significa “devidamente aprovados e chamados”?

Há uma chamada divina para o ministério e uma chamada da igreja. Devemos lembrar sempre que o ministério não é uma profissão, mas um ofício. Ninguém pode simplesmente decidir tornar-se um ministro da mesma maneira que decide tornar-se advogado ou exercer uma linha de trabalho. É preciso ter alguma razão para se crer que seja chamado para o ministério. Isso não quer dizer uma revelação especial do céu, como um sonho ou uma visão, mas a consciência de que se possui em alguma medida as qualificações exigidas, juntamente com o sincero desejo de pregar o evangelho, a disposição para fazer sacrifícios pela causa de Cristo e de empenhar-se para obter a preparação necessária. Deus conduzirá ao ministério, da Sua própria maneira, àqueles a quem Ele chamar.

A chamada da igreja consiste, primeiro, em autenticar a chamada de Deus pela “devida aprovação” do candidato, suas convicções religiosas, sua habilidade geral e a sua preparação acadêmica e teológica. Essa “aprovação” está normalmente dividida em vários estágios. Primeiro, o candidato é recebido sob os cuidados de um presbitério como estudante para o ministério; depois de uma preparação parcial ele é licenciado para pregar; finalmente, depois de completada a preparação e com o convite de uma congregação ou junta missionária é ordenando ao ofício do ministério.

A chamada formal da igreja é o convite de alguma congregação para que o candidato venha a ser o seu pastor, ou de alguma junta missionária ou outra agência da igreja visível para que o candidato se engaje na obra missionária local ou no estrangeiro, ou em algum outro aspecto da obra ministerial. Em todo caso, antes que o homem seja ordenado, deve haver uma chamada definitiva — seja para o pastorado de alguma congregação ou de outro campo de trabalho específico.

5. Por que antes de entrar no ofício ministerial o homem tem de ser devidamente chamado por Deus e pela igreja?

Nem mesmo o nosso Senhor Jesus Cristo fez de si sumo sacerdote, mas foi chamado por Deus para esse ofício da mesma maneira que Arão o fora (Hb 5.4-5). Apesar disso existem hoje muitos pregadores e missionários freelancers e independentes. Essa é uma tendência errada e deve ser desencorajada. Muitos desses pregadores e missionários independentes podem verdadeiramente ter sido chamados por Deus e podem estar fazendo um bom trabalho pregando a Cristo, e este crucificado; mas há uma certa falta de consideração e negligência da igreja visível como instituição divina comprometida com a atitude deles, e que não pode ser aprovada. O chamado de Deus e o chamado da igreja não são antagônicos, toda verdadeira igreja é instrumento de Deus para o treinamento e o ordenamento de homens no ofício ministerial. Alguns há que, alegando uma piedade superior, sustentam que a chamada de Deus é suficiente e que eles não precisam da chamada e da ordenação da igreja. Essa falta de respeito para com a igreja visível não é bíblica e deve ser desestimulada.

Extraído do livro Catecismo Maior de Westminster Comentado, por I. G. Vos, Editora Os Puritanos, páginas 508-511



O Catecismo Maior de Westminster é adotado oficialmente pela Igreja Presbiteriana do Brasil como sistema expositivo de doutrina e prática juntamente com o Breve Catecismo e a Confissão de Fé (CONSTITUIÇÃO DA IGREJA PRESBITERIANA DO BRASIL, CAPÍTULO I — NATUREZA, GOVERNO E FINS DA IGREJA, § 1).

quarta-feira, 20 de junho de 2012

VEM AÍ O PRIMEIRO ENCONTRO NACIONAL DE BLOGUEIROS CRISTÃOS


VINACC realizará Encontro de Blogueiros Evangélicos na 15ª Consciência Cristã

Com realização entre os dias 06 e 12 de fevereiro de 2013, acontecerá em Campina Grande-PB a 15ª edição da Consciência Cristã, que terá como tema central a passagem escrita em Romanos 12.2a- "E não vos Conformeis com este Mundo". 

Durante o Encontro acontecerão vários eventos paralelos que proporcionarão aos participantes uma programação ampla e diversificada. Em parceria com a UBE- União de Blogueiros Evangélicos- a VINACC anuncia que um destes eventos paralelos será o I ENBLOGUE- Encontro Nacional de Blogueiros Evangélicos, que receberá os seguintes preletores: Pr. Renato Vargens (ICNA/RJ), Drª. Norma Braga (IPB/CE), Pr. Carlos Roberto da Silva (AD/SP), Pr. Altair Germano (AD/PE), Valmir Nascimento (AD/MT) e Vinicius Pimentel (Voltemos ao Evangelho/SP).


Veja as temáticas que serão abordadas no I ENBLOGUE:

* “Entendendo a Blogosfera Cristã: A Gênese da blogosfera cristã: como tudo começou; A importância de existir uma blogosfera cristã; Como aumentar e melhorar a blogosfera cristã; A necessidade de qualificação dos blogueiros cristãos; Como potencializar a influência da blogosfera cristã?”

* “Blogosfera cristã: Ontem, Hoje e Amanhã: Princípios norteadores que devem reger a blogosfera cristã; A blogosfera cristã e o futuro da igreja brasileira; Qual a influência da blogosfera para a Teologia Cristã (Apologética e Cosmovisão). Blogosfera cristã: Focar o mundo, a igreja ou ambos?

* “Blogosfera cristã: Ontem, Hoje e Amanhã: Princípios norteadores que devem reger a blogosfera cristã; A blogosfera cristã e o futuro da igreja brasileira; Qual a influência da blogosfera para a Teologia Cristã (Apologética e Cosmovisão). Blogosfera cristã: Focar o mundo, a igreja ou ambos?

* “Do blog para a editora: como fazer posts se transformarem em livro: cases de sucesso”.

Dentro da programação do I ENBLOGUE acontecerá também a Mesa de debates  “A realidade dos blogs e a nova liderança intelectual”. Qual de fato é o poder da blogosfera evangélica? E por que os líderes evangélicos devem investir ou apoiar blogs reconhecidamente evangélicos? - que terá a participação de Valmir Nascimento, Altair Germano, Carlos Roberto da Silva, Renato Vargens, Vinicius Pimentel e Norma Braga.


Outra novidade já divulgada pelos organizadores do Encontro, será, em parceria da VINACC com a UBE, o lançamento de mais uma obra da Editora VCP -Visão Cristocêntrica Publicações- O livro “Manual do Blogueiro Cristão”.

A supervisão do I ENBLOGUE será do Dr. Uziel Santana Dos Santos, e a coordenação de Wallace Sousa - um dos diretores da UBE.

Publicado originalmente no site Consciência Cristã

quinta-feira, 14 de junho de 2012

APELO FANÁTICO AO ESPÍRITO EM DETRIMENTO DA ESCRITURA


Por João Calvino

Ademais, aqueles que, repudiada a Escritura, imaginam não sei que via de acesso a Deus, devem ser considerados não só possuídos pelo erro, mas também exacerbados pela loucura. Ora, surgiram em tempos recentes certos desvairados que, arrogando- se, com extremada presunção, o magistério do Espírito, fazem pouco caso de toda leitura da Bíblia e se riem da simplicidade daqueles que ainda seguem, como eles próprios a chamam, a letra morta e que mata.

Eu, porém, gostaria de saber deles que Espírito é esse de cuja inspiração se transportam a alturas tão sublimadas que ousem desprezar como pueril e rasteiro o ensino da Escritura? Ora, se respondem que é o Espírito de Cristo, tal certeza é absurdamente ridícula, se na realidade concedem, segundo penso, que os apóstolos de Cristo, e os demais fiéis na Igreja primitiva, foram iluminados não por outro Espírito. O fato é que nenhum deles daí aprendeu o menosprezo pela Palavra de Deus; ao contrário, cada um foi antes imbuído de maior reverência, como seus escritos o atestam mui luminosamente. E, na verdade, assim fora predito pela boca de Isaías. Pois o povo antigo não cinge ao ensino externo como se lhe fosse uma cartilha de rudimentos, onde diz: “Meu Espírito que está em ti, e as palavras que te pus na boca, de tua boca não se apartarão, nem da boca de tua descendência, para sempre” (Is 59.21), senão que ensina, antes, haver de ter a nova Igreja, sob o reino de Cristo, esta verdadeira e plena felicidade: que seria regida pela voz de Deus, não menos que pelo Espírito. Do quê concluímos que, em nefando sacrilégio, estes dois elementos que o Profeta uniu por um vínculo inviolável são separados por esses biltres.

A isto acresce que Paulo, arrebatado que foi até ao terceiro céu (2 Co 12.2), entretanto não deixou de aprofundar-se no ensino da lei e dos profetas, assim como também exorta a Timóteo, mestre de singular proeminência, a que se devotasse a sua leitura [1Tm 4.13]. E digno de ser lembrado é esse elogio com que adorna a Escritura: “é útil para ensinar, admoestar, redargüir, a fim de que os servos de Deus se tornem perfeitos” (2Tm 3.16). De quão diabólica loucura é imaginar como se fosse transitório ou temporário o uso da Escritura que conduz os filhos de Deus até a meta final!

Em seguida, desejaria que também me respondessem isto: porventura beberam de outro Espírito além daquele que o Senhor prometia a seus discípulos? Ainda que se achem possuídos de extrema insânia, contudo não os julgo arrebatados de tão frenético desvario que ousem gabar-se disso. Mas, ao prometê-lo, de que natureza declarava haver de ser esse Espírito? Na verdade, um Espírito que não falaria por si próprio; ao contrário, que lhes sugeriria à mente, e nela instilaria o que ele próprio havia transmitido por meio da Palavra (Jo 16.13).

Logo, não é função do Espírito que nos foi prometido configurar novas e inauditas revelações ou forjar um novo gênero de doutrina, mediante a qual sejamos afastados do ensino do evangelho recebido; ao contrário, sua função é selar-nos na mente aquela mesma doutrina que é recomendada através do evangelho.

Do Livro 1 das "Institutas da Religião Cristã".