quinta-feira, 28 de julho de 2011

CHAMADOS A OUVIR DUAS VEZES

Por John Stott

A principal razão para toda traição ao verdadeiro Jesus é que nós ouvimos com exagerada deferência a moda contemporânea, ao invés de escutarmos a Palavra de Deus. A busca por relevância torna-se tão impetuosa que nós sentimos que temos que capitular diante dela, independente do custo. Estamos acostumados a esse tipo de pressão no mundo dos negócios, onde quem determina o produto da firma são os especialistas em marketing, ao descobrirem o que irá vender, o que o público irá comprar. Às vezes parece que o mercado impõe sua regras também à igreja. Com toda prestatividade, nós cedemos ao espírito moderno, tornando-nos escravos da última moda, e até mesmo idó­latras, dispostos a sacrificar a verdade no altar da mo­dernidade. Então a busca por relevância acaba se degene­rando, transformando-se em uma obsessão por populari­dade.

O outro extremo da irrelevância é a acomodação, que é uma covarde e inescrupulosa rendição ao Zeitgeist, o espírito da época. Thielicke foi assaltado por esse perigo, pois ele não conseguia esquecer como é que os assim cha­mados "cristãos germânicos", durante o Terceiro Reich de Hitler, aceitavam e até defendiam os mitos raciais dos nazistas. Ele insistia, portanto, em que a verdadeira teo­logia "sempre implica num debate entre o kerygma e a autocompreensão de uma era... entre a eternidade e o tempo". Ademais, nesse debate "a fé acredita tanto contra como em"; ela nasce em uma reação consciente a idéias correntes. Assim, Thielicke escreve sobre a "estrutura polar" da teologia, na qual um polo é "uma base eterna e superior que se deriva da revelação" e o outro é cons­tituído de "constelações específicas do espírito da época". "A fé", insiste ele, "sempre será um risco ... ela há de implicar, não um porquê, mas um apesar de em face da realidade do humano."

Da mesma forma, Peter Berger, como sociólogo cristão, tem algumas coisas pertinentes a dizer acerca da neces­sidade de se caminhar cautelosamente entre a irrelevância e a acomodação:Eu gostaria de esclarecer uma vez mais que não estou dizendo que os cristãos não deveriam ouvir as idéias dos outros, ou levar a sério o que acontece no seu contexto cultural, ou participar de lutas políticas do seu tempo. O que me perturba não é o fato de se ouvir como tal, mas, sim, o fato de ouvir com adulação acrítica, se não intenção idólatra — de ouvir, se é que se ouve, de olhos arregalados e boquiabertos de admiração”.

E Peter Berger continua dizendo: "Eu acho que simples­mente chegou a hora de dar um 'Basta!' a essa dança em torno dos bezerros de ouro da modernidade". Mais im­portante do que indagar o que o homem moderno tem a dizer à igreja é perguntar o que a igreja tem a dizer ao homem moderno.

O povo de Deus vive num mundo que é frequentemente inamistoso e, certas vezes, declaradamente hostil. Nós vivemos constantemente expostos à pressão para "entrar­mos na forma". No entanto, através de toda a Escritura, somos exortados a uma firme não-conformação, e as ad­vertências para quem cede ao mundanismo são muito sérias. No Antigo Testamento o Senhor disse ao seu povo depois do êxodo: "Não fareis segundo as obras da terra do Egito, em que habitastes, nem fareis segundo as obras da terra de Canaã, para a qual eu vos levo, nem andareis nos seus estatutos. Fareis segundo os meus juízos, e os meus es­tatutos guardareis..." Mesmo assim o povo disse a Samuel: "... constitui-nos, pois, agora, um rei sobre nós, para que nos governe, como o têm todas as nações". E, mais tarde, Ezequiel teve que repreendê-los por sua idolatria: "...dizeis: Seremos como as nações, como as outras gerações da terra, servindo ao pau e à pedra". Foi a mesma coisa nos dias do Novo Testamento. A despeito dos mandamentos bem claros de Jesus — "Não vos assemelheis a eles" - e de Paulo - "Não vos conformeis com este mundo" -, a constante tendência do povo de Deus era, e ainda é, com­portar-se "como os gentios" - até que nada mais parece distinguir a igreja do mundo, os cristãos dos não-cristãos, em convicções, valores e padrões.

Graças a Deus, porém, sempre houve algumas almas nobres que permaneceram firmes, às vezes sozinhas, re­cusando-se a se comprometer. Penso em Jeremias no século VI a.C, em Paulo, no seu tempo ("todos:.. me abandona­ram"), Atanásio no século IV e Lutero no século XVI. C. S. Lewis escreveu seu tributo a Atanásio, que sustentou a divindade de Jesus e a doutrina da Trindade, quando a igreja inteira estava decidida a seguir o herege Ário: "Sua glória é que ele não seguiu o curso da época; sua recompensa é que agora ele permanece, enquanto aquela época, como todas as épocas, já se foi".

Hoje, pois, nós estamos decididos a lutar para apresentar o evangelho de tal forma que ele fale aos dilemas, temores e frustrações do mundo moderno; estamos, no entanto, igualmente decididos a não comprometer o evangelho a fim de fazer isso. Certas pedras de tropeço são intrínsecas ao evangelho original e não podem ser eliminadas, e nem mesmo abrandadas, a fim de torná-lo mais agradável ao paladar contemporâneo. O evangelho contém certos aspec­tos tão estranhos ao pensamento moderno que ele sempre há de parecer "loucura" para os intelectuais, por mais que nos esforcemos (e com razão) para mostrar que ele é "de verdade e de bom senso". A cruz sempre há de constituir-se em uma agressão à justiça própria do homem, bem como um desafio à sua auto-indulgência. Seu "escândalo" (pedra de tropeço) simplesmente não pode ser removido. De fato, a igreja fala ao mundo com mais autenticidade, não quando ela faz adaptações vergonhosas motivadas por covardia, mas, sim, quando se nega a fazê-las; não quando ela se torna totalmente indistinta do mundo, mas quando sua luz distintiva brilha ainda mais.

John Stott em: "Ouça o Espírito, ouça o mundo", editora ABU.

quinta-feira, 21 de julho de 2011

A DIVINA TRINDADE

O Ser Eterno se revela em Sua existência triúna até mesmo de forma mais rica e indispensável do que em Seus atributos. É nessa Trindade santa que cada atributo do Seu Ser alcança, digamos, o seu conteúdo pleno e o seu significado mais profundo. Somente quando nós contemplamos essa trindade é que nós descobrimos quem e o que Deus é. Só assim nós podemos descobrir quem e o que Ele é para essa humanidade perdida. Nós só podemos descobrir isso quando nós o conhecemos e confessamos como o Deus Triúno do Pacto, como o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Ao considerarmos essa parte da nossa confissão é particularmente necessário que um tom de reverencia santa e um temor ingênuo caracterizem nossa aproximação e atitude. Para Moisés foi um momento terrível e inesquecível aquele em que Deus lhe apareceu no deserto em uma sarça ardente. Quando Moisés olhou para a saca ardente, que ardia e não se consumia, a certa distância, e quis aproximar-se, o Senhor o advertiu, dizendo: “Não te chegues para cá; tira as sandálias dos pés, porque o lugar onde estás é terra santa”. Ao ouvir essas palavras Moisés temeu muito e escondeu seu rosto, pois temia olhar para Deus (Ex 3.1-6).

Tal respeito santo convém também a nós como testemunhas da revelação que Deus faz de si mesmo em Sua Palavra como o Deus Triúno, pois nós devemos sempre nos lembrar que, quando nós estudamos esse fato nós não estamos tratando de uma doutrina sobre Deus, ou de um conceito abstrato, ou de uma proposição científica a respeito da Divindade. Nós não estamos lidando com uma construção humana na qual nós mesmos ou outras pessoas tenham arrumado os fatos, e que nós agora vamos tentar analisar logicamente e desmembrar. Nós estamos tratando da Trindade, estamos lidando com o próprio Deus, com o único e verdadeiro Deus, que revelou-se como tal em Sua palavra. Isso foi o que Ele disse a Moisés: “Eu sou o Deus de Abraão, Isaque e Jacó” (Ex 3.6). Assim também Ele se revela a nós em Sua Palavra e se manifesta a nós como o Pai, o Filho e o Espírito.

E é assim que a Igreja Cristã sempre tem confessado a revelação de Deus como o Deus Triúno, e aceitado-o como tal. Nós encontramos essa confissão nos Doze Artigos do Credo apostólico. O cristão não está nesse credo dizendo o que ele pensa sobre Deus. Ele não está dando ao leitor uma noção de Deus, nem dizendo que Deus tem tal e tal atributos, e que Ele existe dessa ou daquela forma. Ele simplesmente confessa: “Creio em Deus Pai, e em Jesus Cristo, seu único filho, e no Espírito Santo, ou seja, eu creio no Deus Triúno”. Ao fazer essa confissão o cristão expressa o fato de que Deus é o Deus vivo e verdadeiro, que é o Deus Pai, Filho e Espírito, o Deus de sua confiança, a quem ele tem se rendido inteiramente, e em quem ele descansa com todo o seu coração. Deus é o Deus de sua vida e de sua salvação. Como Pai, Filho e Espírito, Deus o criou, redimiu-o, santificou-o e glorificou-o. O cristão deve tudo a Ele. É sua alegria e prazer que ele possa crer nesse Deus, confiar nele e esperar tudo dele.

Extraído do livro: “O Fundamento de Nossa Fé - Um Panorama da Doutrina Cristã” de Herman Bavinck.

quarta-feira, 20 de julho de 2011

“TUDO DEMAIS PASSA DA MEDIDA”

“Tudo demais passa da medida”. Minha mãe usava essa frase para me corrigir quando eu exagerava em alguma coisa. Se eu comesse demais, se eu brincasse demais, se eu dormisse demais, se eu falasse demais, enfim, para tudo que eu fizesse além da conta, minha mãe vinha com a reprimenda: “Tudo demais passa da medida”.

A frase é óbvia, mas o princípio cabe, realmente, em muitas situações. Tudo que é exagerado passa a ser prejudicial. O sentido é que há uma medida de tolerância para todas as coisas, e ao se ultrapassar essa medida, corre-se sempre riscos. O melhor é respeitar a medida, respeitar os limites, respeitar a fronteira da tolerância em cada caso para não levar prejuízos.
A causa gay perdeu a medida, ultrapassou os limites e perdeu o foco. Se antes o interesse era brigar pelos direitos dos homossexuais como cidadãos, hoje, o desejo é obrigar a sociedade a reconhecer os homossexuais como cidadãos superiores. Se antes, ao introduzir personagens gays nas novelas, o interesse era que o público se acostumasse com o comportamento homossexual, hoje o propósito é forçar o público a aceitar o homossexualismo como certo e até normativo para a sociedade. Se antes as passeatas do orgulho gay eram para se fazer festa, hoje é para fazer política. Se antes os gays tratavam os crentes como caretas, agora querem que eles sejam tratados como criminosos. Os promotores da causa gay fizeram tanto barulho que passaram da medida e criaram insatisfação onde pretendiam criar simpatia e apoio.
A insatisfação da sociedade com os exageros da luta pela causa gay está ganhando força e encontrou espaço em jornais, revistas e sites de grande acessibilidade e importância através do pronunciamento de gente inteligente que não representa, necessariamente, algum segmento anti-homossexualismo. Há juristas questionando a legitimidade da recente decisão do STF em favor da união estável entre pessoas do mesmo sexo. Há políticos  dispostos a lutar contra a aprovação do tal PLC-122/2006. Há jornalistas sérios escrevendo contra os excessos de proteção e promoção dos direitos da causa gay no Brasil. E agora há até mesmo emissoras de TV exigindo dos autores de novelas que pisem no freio e diminuam a exposição de temas ligados ao homossexualismo em suas tramas, alegando que há uma overdose do assunto nas estórias.
Preciso concordar com minha mãe. “Tudo demais passa da medida”. Tudo demais perde o sentido. No caso específico da causa gay, perde-se muito mais, porque a causa gay é uma causa sem sentido. Não há sentido em se lutar por uma causa que vai contra os valores da própria constituição humana. Não há sentido em uma causa que rivaliza com a determinação divina.
A causa gay está passando da medida. Da medida do suportável, do respeitável, do tolerável. Ainda bem que há quem perceba isto a tempo e se manifeste de maneira sóbria e inteligente, para que não se diga que apenas a igreja não suporta mais os exageros dos defensores da causa gay. A sociedade em geral está dando sinais de que esta causa não representa o interesse da maioria, mas de uma minoria que precisa se colocar em seu devido lugar.

Agnaldo Silva Mariano

terça-feira, 19 de julho de 2011

O BATISMO DOS FILHOS DOS CRENTES

Por R.C. Sproul

Embora o batismo de crianças tenha sido uma prática importante no cristianismo histórico, sua validade tem sido solenemente desafiada por cristãos piedosos de várias denominações. A questão em torno do batismo de crianças baseia-se em vários aspectos. O Novo Testamento não ordena explicitamente que as crianças sejam batizadas, nem explicitamente proíbe que sejam batizadas. O debate se concentra em questões que geram em torno do significado do batismo e do grau de continuidade entre a Antiga e a Nova Aliança.

A mais crucial objeção por parte daqueles que se opõem ao batismo de crianças é que o sacramento do batismo pertence aos membros da igreja, e que a igreja é uma companhia de crentes. Visto que as crianças são incapazes de exercer fé, não devem ser batizadas. Enfatiza-se também que dos batismos registrados no Novo Testamento não há nenhuma referência específica a crianças. Uma outra objeção é que a Antiga Aliança, embora não comunique a salvação por via biológica, pela linhagem de sangue, não obstante envolvia uma ênfase étnica à nação de Israel. A aliança era transmitida através dos laços familiares e nacionais. No Novo Testamento a aliança tornou-se mais abrangente, admitindo os gentios na comunidade da fé. Este sinal de descontinuidade estabelece uma diferença entre a circuncisão e o batismo.

Por outro lado, aqueles que são favoráveis ao batismo de crianças enfatizam seu paralelo com a circuncisão. Embora o batismo e a circuncisão não sejam idênticos, têm pontos cruciais em comum. Ambos são sinais da aliança e ambos são sinais da fé. No caso de Abraão, ele abraçou a fé depois de adulto e fez uma profissão de fé antes de ser circuncidado. Ele tinha fé antes de receber o sinal desta fé. Seu filho Isaque, por outro lado, recebeu o sinal da fé antes que tivesse a fé que o sinal simbolizava (como foi o caso de todos os outros filhos da aliança).

O ponto crucial é que no Antigo Testamento Deus ordenou que o sinal da fé fosse dado antes que a fé estivesse presente. Visto que esse era claramente o caso, seria um equívoco argumentar em princípio que é errado administrar um sinal de fé antes que a fé esteja presente.

É também importante observar que os relatos de batismos no Novo Testamento foram de adultos que anteriormente eram incrédulos. Pertenciam à primeira geração de cristãos. Além disso, sempre tem sido a regra que convertidos adultos (que não eram filhos de crentes em sua infância) devem primeiro fazer a profissão de fé antes de receberem o batismo, o qual é o sinal de sua fé.

Cerca de um quarto dos batismos mencionados no Novo Testamento indica que famílias inteiras foram batizadas. Isso sugere fortemente, embora não o prove, que as crianças eram incluídas entre os que eram batizados. Visto que o Novo Testamento não exclui explicitamente as crianças do sinal da aliança (e foram incluídas por milhares de anos enquanto o sinal da aliança era a circuncisão), naturalmente podemos presumir que na igreja primitiva as crianças deviam receber o sinal da aliança.

A história testemunha a favor dessa suposição. A primeira menção direta ao batismo de criança aconteceu por volta da metade do segundo século. O que é digno de nota nessa referência é que ela pressupõe que o batismo de crianças era uma prática universal da igreja. Se o batismo de crianças não fosse uma prática na igreja do primeiro século, como e por que este afastamento da ortodoxia aconteceu tão rápido e de forma tão prevalecente? Não só a difusão foi rápida e universal, como também a literatura remanescente daquela época não reflete qualquer controvérsia concernente a esta questão.

Em geral, a Nova Aliança é mais inclusiva do que a Antiga Aliança. Aqueles que contestam a validade do batismo de crianças estão tornando a Nova Aliança menos inclusiva com relação às crianças, a despeito da ausência de qualquer proibição bíblica contra o batismo de crianças.

Extraído do livro: "Verdades Essenciais da Fé Cristã", Editora Cultura Cristã.

segunda-feira, 18 de julho de 2011

O ENSINO DA REFORMA PROTESTANTE SOBRE A JUSTIFICAÇÃO

A redescoberta da doutrina da justificação foi a razão da Reforma do século dezesseis. A Reforma foi uma reação contra as falsas doutrinas e as tradições corruptas que tinham entrada na igreja católica romana até aquele tempo. Vamos esboçar o desenvolvimento gradativo desses erros.

Primeiro, houve o ensino católico-romano referente ao perdão do pecado. Foi ensinado que todo o pecado (inclusive o pecado original) praticado antes do batismo, foi perdoado pelo batismo, e que mediante o batismo a pessoa efetivamente recebia uma nova vida espiritual.

Todo o pecado praticado depois do batismo foi perdoado somente quando confessado a um sacerdote, cumpridas as penitências e sofridas as penas do purgatório. (Na verdade, isso não é nenhum perdão, porque tais pecadores não são perdoados gratuitamente, antes, têm de suportar um longo processo de sofrimento.)

Os católicos romanos dividiram o pecado em duas classes: mortal - que somente a morte de Cristo podia expiar; e venial - merecendo apenas os castigos e penitências desta vida. (A Bíblia não estabelece nenhuma distinção; pelo contrário, ela vê cada pecado como "mortal".)

Segundo, apesar dos esforços através de penitências, houve uma consciência de continuada imperfeição e pecado, e isso gerou a idéia da transferência dos méritos das pessoas santíssimas para as mais fracas.

Foi asseverado que essa sobra de méritos que os santos e mártires acumularam ao longo dos anos poderia ser distribuído pelo próprio papa, ou através de seus representantes autorizados. Essas "indulgências", como foram chamadas, poderiam ser adquiridas por dinheiro. A venda delas proporcionava uma fonte de renda para o papa.

Terceiro, junto com esses erros a respeito do mérito humano, surgiu a idéia de que a missa poderia ser, pela intenção do sacerdote, um verdadeiro sacrifício do próprio corpo e sangue de Cristo. Supostamente, o pão e o vinho se tornariam a carne e o sangue de Cristo. Independente do valor do mérito humano, o mérito de repetidas celebrações da morte de Cristo certamente seria inesgotável! Assim o "sacrifício do altar" tornou-se também uma fonte de lucro financeiro na medida em que as multidões providenciaram (e pagaram) méritos em favor das almas dos vivos e dos mortos.

Existem quatro maneiras pelas quais o ensino das Escrituras, e conseqüentemente o dos reformadores, divergiu do ensino católico-romano sobre a justificação:

1) A natureza da justificação. O ensino da igreja católica romana era que, pelo batismo, o pecador verdadeiramente recebia uma nova vida espiritual, capacitando-o a justificar a si mesmo. Os reformadores ensinaram que, de acordo com as Escrituras, a justificação é o total perdão de todos os pecados por uma decisão graciosa da parte de Deus, de forma que o pecador é imediatamente considerado justo.

2) A base para a justificação. A igreja católica romana ensinava que Deus aceita o pecador em virtude da nova vida espiritual recebida pelo batismo. As Escrituras, bem como os reformadores, ensinaram que a justiça de Cristo, imputada ao pecador, é a única base de justificação.

3) O método da justificação. A igreja católica romana ensinava que o pecador é justificado quando a vida espiritual recebida pelo batismo produz ações piedosas, isto é, confissões, participação nos sacramentos da igreja, penitências, etc. As Escrituras, bem como os reformadores, ensinaram que a justificação é somente pela fé em Cristo. Com toda certeza, fé verdadeira há de produzir o "fruto do Espírito" na vida do justificado. A justificação é biblicamente ligada à fé, e não às boas obras que procedem da fé.

4) O efeito da justificação. A igreja católica romana ensinava que a justificação nunca será perfeitamente realizada. Há sempre uma necessidade para praticar mais penitências por causa dos pecados posteriores. Ninguém pode ter a certeza de uma justificação total até a sua chegada nos céus, depois de sofrer as penas do purgatório. As Escrituras, bem como os reformadores, ensinaram que a justificação inclui o gratuito perdão de todo o pecado e garante a vida eterna. Eles falaram do ensino católico-romano como "uma fé incerta, cheia de dúvidas". Isso e tão diferente do ensino protestante sobre a natureza completa, final e irreversível da justificação por um ato gracioso da parte de Deus.

No processo de exaltar a importância do esforço humano na justificação, o ensino da igreja católica romana rebaixa a riqueza e a maravilha da graça de Deus. Os méritos da vida e da morte de Cristo não são mais suficientes - o pecador deve acrescentar os supostos méritos de seus próprios esforços. Não existe apenas um único sacrifício pelo pecado; o sacrifício tem de ser repetido vezes sem fim mediante a missa. Os esforços do pecador para justificar a si mesmo podem ser enriquecidos pelos méritos de outros santos e mártires. O perdão não é uma dádiva imediata de Deus, antes, é algo incerto, dependente da confissão, penitência, e uma absolvição concedida por um sacerdote humano. E o comércio corrupto de vender indulgências (que tanto ofendia Lutero) surgiu de todos estes erros de doutrina, como Lutero perspicuamente discerniu. A verdade bíblica da justificação pela fé, dada gratuitamente por Deus e trazendo a certeza da salvação para o pecador faiscou como corrente elétrica através das dúvidas e corrupções do século dezesseis. Essa nova compreensão conduziu algumas igrejas para uma reforma e uma renovação segundo os padrões dos tempos apostólicos.

Extraído do livro: "Declarado Inocente", de James Buchanan - Editora PES.

quinta-feira, 14 de julho de 2011

PASTORES DESMOTIVADOS

Qualquer um pode sentir-se desanimado no exercício de sua profissão. Vários fatores podem gerar a desmotivação e provocar questionamentos quanto à continuidade ou não do exercício da ocupação escolhida. Baixa produtividade, remuneração inadequada, condições de trabalho impróprias, insatisfação com colegas são alguns fatores que poderiam ser nomeados, entre outros tantos.
Como quaisquer outros trabalhadores, pastores também podem sofrer esse tipo de problema e, às vezes, sentirem-se desmotivados a continuar exercendo o ofício que escolheram ou, em se tratando de pastores de verdade, para o qual foram escolhidos, pois creio que pastorear é uma vocação, não uma profissão. É chamado divino e não mera escolha pessoal.

O ministério pastoral, à semelhança de quaisquer outras atividades, tem seus desafios, alegrias e dificuldades próprias. Acredite, não é fácil ser pastor. Acho que nunca foi. O pastor lida com questões que fogem à mera capacidade técnica de solução. O pastor lida com pessoas, e pessoas têm crises, têm dificuldades, têm dramas e problemas que não se resolvem com um comprimido, ou um chá, e, às vezes, não se resolvem nem mesmo com uma palavra ou um conselho. Há situações que as pessoas enfrentam que exigem um esforço descomunal do pastor e, muitas dessas situações, nunca serão solucionadas por ele, por mais que se esforce.
O pastor lida com desafios eclesiásticos imensos. São exigências e cobranças, muitas delas desproporcionais ao seu chamado e capacitação. Em muitas igrejas o pastor precisa ocupar diversas funções para as quais ele não tem nem vocação, nem habilidade, nem tempo para fazer. Há pastores se desgastando tentando ser e fazer o que não são e nem têm obrigação ou aptidão para realizar, mas precisam produzir, demonstrar capacidade, alcançar resultados.

Em certas igrejas o pastor abre e fecha a igreja, limpa o templo, conserta a parte elétrica, prepara a santa ceia, prega, toca, canta, e ainda precisa arrumar tempo para ser psicólogo, advogado, administrador, juiz de paz, motorista particular e o que mais o povo achar que o pastor sabe fazer. E muitos pastores ainda precisam conviver com igrejas complicadas, com membros preguiçosos, encrenqueiros, rebeldes que, mesmo tendo sugado o máximo do pastor por anos a fio, sentem-se no direito de mudar de igreja a qualquer momento sob a desculpa de não terem sido assistidos a contento.

Estas e outras situações, muitas vezes, provocam um desgaste imenso e o pastor fica à beira do perigoso precipício da depressão, do esgotamento emocional e espiritual. É aí que muitos pastores se tornam desmotivados no ministério.

Há pastores desmotivados no ministério por não conseguirem realizar o seu verdadeiro chamado. São servos de Deus que sabem para que o Senhor os vocacionou, mas a correria e as muitas exigências absurdas da igreja não lhes permitem ser o que Deus quer que eles sejam, nem fazer o que Deus os chamou para fazer. Há outros que estão desmotivados por falta de ajuda e apoio da liderança, dos membros ou da denominação. Há os que estão desmotivados por não terem apoio da esposa e dos filhos. Outros estão desmotivados por não serem amados devidamente ou respeitados dignamente. Há pastores desmotivados no ministério por se decepcionarem com colegas que, ao invés de serem companheiros, tornam-se adversários e concorrentes desleais.
O grande problema é que pastores desmotivados desmotivam a igreja. Pastores desmotivados no ministério tornam-se, muitas vezes, cruéis com as ovelhas, pois descarregam nelas sua frustração e desânimo. Pastores desmotivados correm ainda o risco de tentar resolver sua frustração lançando mão de meios inadequados e questionáveis para resgatar o prazer de pastorear. Pastores desmotivados no ministério podem se tornar perigosos instrumentos nas mãos do inimigo para escandalizar o povo de Deus.

Eu creio que qualquer pastor pode sentir-se desmotivado em algum momento da sua vida ministerial. Mas o pastor não pode entregar-se ao desânimo e continuar insistindo no pastoreio sem achar-se devidamente condicionado a isto.
Pastores desmotivados precisam urgentemente de ajuda. Precisam confessar sua desmotivação humildemente ao Senhor pedindo seu auxílio. Precisam compartilhar com colegas sua situação a fim de dividir a carga e pedir apoio. Precisam honestamente compartilhar a situação com sua família em busca de fortalecimento. Precisam se abrir com a liderança da sua denominação a fim de encontrar uma saída para as crises. Precisam, ainda, se for o caso, compartilhar com suas ovelhas a situação que enfrentam para achar alternativas viáveis para o resgate da alegria ministerial.

Entretanto, se o pastor descobrir que a sua desmotivação se dá em função de não ter certeza da vocação para o ministério, melhor será que ele deixe o ministério e procure o seu verdadeiro chamado. Pior do que ser um pastor desmotivado é ser um falso pastor.

Agnaldo Silva Mariano

quarta-feira, 13 de julho de 2011

A PERSEVERANÇA DOS SANTOS

Apresento, aos leitores do blog, uma exposição do chamado "Quinto Ponto do Calvinismo". Esta é uma doutrina de extrema beleza, extraída das páginas das Escrituras e confirmada pelo documento elaborado no Sínodo de Dordrecht (Holanda) no século XVII. A Perseverança dos Santos foi o tema da minha monografia no Seminário e, cada vez que a estudo, mais me encanto e ainda mais reforço minha crença e confissão em suas verdades.

Artigo 1: 0 regenerado não está livre do seu pecado. Aqueles que, de acordo com o seu propósito, Deus chama à comunhão do seu Filho, nosso Senhor Jesus Cristo, e regenera pelo seu Santo Espírito, ele certamente os livra do domínio e da escravidão do pecado. Mas nesta vida, ele não os livra totalmente da carne e do corpo de pecado (Rm 7.24).


Artigo 2: Pecados diários de fraqueza. Portanto, pecados diários de fraqueza surgem e até as melhores obras dos santos são imperfeitas. Estes são para eles constante motivo para humilhar se perante Deus e refugiar se no Cristo crucificado. Também são motivo para mais e mais mortificar a carne através do espírito de oração e através dos Santos exercícios de piedade, e ansiar pela meta da perfeição. Eles fazem isto até que possam reinar com o Cordeiro de Deus nos céus, finalmente livres deste corpo de morte.


Artigo 3: Deus preserva os seus. Por causa dos seus pecados remanescentes e também por causa das tentações do mundo e de Satanás, aqueles que têm sido convertidos não poderiam perseverar nesta graça se deixados ao cuidado de suas próprias forças. Mas Deus é fiei: misericordiosamente os confirma na graça, uma vez conferida eles, e poderosamente os preserva [na sua graça] até o fim.


Artigo 4: Os santos podem cair em pecados sérios. O poder de Deus, pelo qual ele confirma e preserva os verdadeiros crentes na graça, é tão grande que isto não pode ser vencido pela carne. Mas os convertidos nem sempre são guiados e movidos por Deus, e assim eles poderiam, em certos casos, por sua própria culpa, desviar se da direção da graça e ser seduzidos pelos desejos da carne e segui los. Devem, portanto, vigiar constantemente e orar para que não caiam em tentação. Quando não vigiarem e orarem, eles podem ser levados pela carne, pelo mundo e por Satanás para sérios e horríveis pecados. Isto ocorre também muitas vezes pela justa permissão de Deus. A lamentável queda de Davi, Pedro e outros santos, descrita na Sagrada Escritura, demonstra isso.


Artigo 5: Os efeitos de tais pecados sérios. Por tais pecados grosseiros, entretanto, eles causam a ira de Deus, se tornam culpados de morte, entristecem o Espírito Santo, suspendem o exercício da fé, ferem profundamente suas consciências e algumas vezes perdem temporariamente a sensação da graça. Mas quando retornam ao reto caminho por meio de arrependimento sincero, logo a face paternal de Deus brilha novamente sobre eles.


Artigo 6: Deus não permite que seus eleitos se percam. Pois Deus, que é rico em misericórdia, de acordo com o imutável propósito da eleição, não retira completamente o seu Espírito dos seus, mesmo em sua deplorável queda. Nem tampouco permite que venham a cair tanto que recaiam da graça da adoção e do estado de justificados. Nem permite que cometam o pecado que leva à morte, isto é, o pecado contra o Espírito Santo e assim sejam totalmente abandonados por ele, lançando se na perdição eterna.


Artigo 7: Deus quer renovar os eleitos para arrependimento. Pois, em primeiro lugar, em tal queda, Deus preserva neles sua Imperecível semente da regeneração, a fim de que esta não pereça nem seja lançada fora. Além disso, através da sua Palavra e de seu Espírito, ele certamente os renova efetivamente para arrependimento. Como resultado eles se afligem de coração, entristecendo se com Deus pelos pecados que têm cometido; procuram e obtém pela fé, com coração contrito, o perdão pelo sangue do Mediador; e experimentam novamente a graça de Deus, que se reconcilia com eles que, através da fé adoram sua misericórdia. E aí em diante eles se empenham mais diligentemente pela sua salvação com temor e tremor.


Artigo 8: A graça do trino Deus preserva. Assim, não é por seus próprios méritos ou força, mas pela imerecida misericórdia de Deus que eles não caem totalmente da fé e da graça e nem permanecem caídos ou se perdem definitivamente. Quanto a eles, isto facilmente poderia acontecer e aconteceria sem dúvida. Quanto a Deus, porém, isto não pode acontecer de modo nenhum. Pois seu decreto não pode ser mudado, sua promessa não pode ser quebrada, seu chamado em acordo com seu propósito não pode ser revogado. Nem o mérito, a intercessão ou a preservação de Cristo podem ser invalidados, e a selagem do Espírito tampouco pode ser frustrada ou destruída.


Artigo 9: A certeza desta preservação. Os crentes podem estar certos e estão certos dessa preservação dos eleitos para a salvação e da perseverança dos verdadeiros crentes na fé. Esta certeza ocorre de acordo com a medida de sua fé, pela qual eles crêem que são e permanecerão verdadeiros e vivos membros da Igreja, e que têm o perdão dos pecados e a vida eterna.


Artigo 10: 0 fundamento desta certeza. Esta certeza não vem de uma revelação especial, sem a Palavra ou fora dela, mas vem da fé nas promessas de Deus, que ele revelou abundantemente em sua Palavra para nossa consolação; vem também do testemunho do Espírito Santo, testificando com o nosso espírito que somos filhos e herdeiros de Deus; e, finalmente, vem do zelo sério e santo por uma boa consciência e por boas obras. E se os eleitos não tivessem neste mundo a sólida consolação de obter a vitória e esta garantia infalível da glória eterna, seriam os mais miseráveis de todos os homens (Rm 8.16,17).


Artigo 11: Esta certeza nem sempre é sentida. No entanto, a Escritura testifica que os crentes nesta vida têm de lutar contra várias dúvidas da carne e, sujeitos a graves tentações, nem sempre sentem plenamente esta confiança da fé e certeza da perseverança. Mas Deus, que é Pai de toda a consolação, não os deixa ser tentados além de suas forças, mas com a tentação proverá também o livramento e pelo Espírito Santo novamente revive neles a certeza da perseverança (1 Co 10.13).


Artigo 12: Esta certeza não leva à acomodação. Entretanto, esta certeza de perseverança não faz de maneira nenhuma com que os verdadeiros crentes se orgulhem e se acomodem. Ao contrário, ela é a verdadeira raiz da humildade, reverência filial, verdadeira piedade, paciência em toda luta, orações fervorosas, firmeza em carregar a cruz e confessar a verdade e alegria sólida em Deus. Além do mais, a reflexão deste benefício é para eles um estímulo para praticar séria e constantemente a gratidão e as boas obras, como é evidente nos testemunhos da Escritura e nos exemplos dos santos.


Artigo 13: Esta certeza produz diligência. Quando pessoas são levantadas de uma queda (no pecado) começam a reviver a confiança na perseverança. Isto não produz descuido ou negligência na piedade delas. Em vez disto produz maior cuidado e diligência para guardar os caminhos do Senhor, já preparados, para que, andando neles, possam preservar a certeza da perseverança. Quando fazem isto, o Deus reconciliado não retira de novo sua face delas por causa do abuso da sua bondade paternal (a contemplação dela é, para os piedosos, mais doce que a vida e sua retirada mais amarga que a morte), e elas não cairão em tormentos mais graves da alma (Ef 2. 10).


Artigo 14: Incluído o uso de meios. Tal como agradou a Deus iniciar sua obra da graça em nós pela pregação do evangelho, assim ele a mantém, continua e aperfeiçoa pelo ouvir e ler do Evangelho, pelo meditar nele, pelas suas exortações, ameaças e promessas, e pelo uso dos sacramentos.


Artigo 15: Esta doutrina é odiada por Satanás, mas amada pela Igreja. Deus revelou abundantemente em sua Palavra esta doutrina da perseverança dos verdadeiros crentes e santos e da certeza dela para a glória do seu Nome e para a consolação dos piedosos. Ele a imprime nos corações dos crentes, mas a carne não pode entende-Ia. Satanás a odeia, o mundo zomba dela, os ignorantes e hipócritas dela abusam, e os heréticos a ela se opõem. A Noiva de Cristo, entretanto, sempre a tem amado ternamente e defendido constantemente como um tesouro de inestimável valor. Deus, contra quem nenhum plano pode se valer e nenhuma força pode prevalecer, cuidará para que a Igreja possa continuar fazendo isso. Ao único Deus, Pai, Filho e Espírito Santo, sejam a honra e a glória para sempre. Amém!


* Extraído de "Os Cânones de Dort - Cinco artigos de Fé sobre o arminianismo".

terça-feira, 12 de julho de 2011

AS IMPLICAÇÕES DO LIVRE-ARBÍTRIO

Por C. H. Spurgeon

De acordo com o esquema do livre-arbítrio, o Senhor tem boas intenções, mas precisa aguardar como um servo, a iniciativa de sua criatura, para saber qual é a intenção dela. Deus quer o bem e o faria, mas não pode, por causa de um homem indisposto, o qual não deseja que sejam realizadas as boas coisas de Deus. O que os senhores fazem, senão destronar o Eterno e colocar em seu lugar a criatura caída, o homem?

Pois, de acordo com essa teoria, o homem aprova, e o que ele aprova torna-se o seu destino. Tem de existir um destino em algum lugar; ou é Deus ou é o homem quem decide. Se for Deus Quem decide, então Jeová se assenta soberano em seu trono de glória, e todas as hostes Lhe obedecem, e o mundo está seguro. Em caso contrário, os senhores colocam o homem em posição de dizer: "Eu quero" ou "Eu não quero. Se eu quiser, entro no céu; se quiser, desprezarei a graça de Deus. Se quiser, conquistarei o Espírito Santo, pois sou mais forte do que Deus e mais forte que a onipotência. Se eu decidir, tornarei ineficaz o sangue de Cristo, pois sou mais poderoso que o sangue, o sangue do próprio Filho de Deus. Embora Deus estipule Seu propósito, me rirei desse propósito; será o meu propósito que fará o dEle realizar-se ou não".

Senhores, se isto não é ateísmo, é idolatria; é colocar o homem onde Deus deveria estar. Eu me retraio, com solene temor e horror, dessa doutrina que faz a maior das obras de Deus - a salvação do homem - depender da vontade da criatura, para que se realize ou não. Posso e hei de me gloriar neste texto da Palavra, em seu mais amplo sentido: "Assim, pois, não depende de quem quer ou de quem corre, mas de usar Deus a sua misericórdia" (Romanos 9:16).

Fonte: http://www.monergismo.com/

sexta-feira, 8 de julho de 2011

JONATHAN EDWARDS. UM HOMEM DOMINADO POR DEUS

Grandes homens e grandes mulheres passam pela história e deixam sua marca, não só para as suas respectivas gerações, mas para gerações posteriores. A maioria das pessoas, por falta de oportunidade ou por falta de interesse, passará pela história e será esquecida. Mas sempre haverá os inesquecíveis.

Nas últimas semanas tenho estudado com a igreja a vida de Jonathan Edwards, especialmente as suas firmes resoluções para uma vida cristã agradável a Deus. Tem sido uma experiência por demais edificante, que tem trazido a mim, especialmente, e à igreja também, um despertamento para um viver cristão mais devotado e comprometido com os valores espirituais. Jonathan Edwards é, sem dúvida, um daqueles personagens inesquecíveis da história.

Jonathan Edwards morreu há quase três séculos. No entanto, ele ainda é considerado o mais notável pregador americano de todos os tempos. E ainda há os que o avaliam como um dos maiores teólogos da América. Ele também se sobressaiu como escritor, e alguns de seus livros são considerados como as maiores obras-primas da literatura cristã americana. Seu ministério pastoral rendeu frutos dignos para o reino de Deus e sua trajetória cristã foi um exemplo para as gerações seguintes.

A influência de Jonathan Edwards não se resumiu apenas aos seus dias. No início do século XX, um estudo traçou a descendência de Edwards. Os resultados foram surpreendentes. Cumpriu-se em sua vida o que diz a Abraão em Gênesis 17. 1 a 8. De Jonathan Edwards veio uma grande e ilustre descendência: trezentos pastores, missionários e professores de teologia; cento e vinte professores universitários; cento e dez advogados; mais de sessenta médicos; mais de sessenta autores de bons livros; trinta juízes; catorze reitores de universidades; numerosos gigantes da indústria norte-americana; oitenta detentores de importantes cargos públicos; três prefeitos de grandes cidades; três governadores de estados; três senadores; um capelão do Senado dos Estados Unidos; um fiscal da Fazenda e um vice-presidente dos Estados Unidos.

Não há dúvidas de que Jonathan Edwards foi um gigante da fé cristã, um homem cuja influência ainda hoje é fortemente sentida. Sobre os personagens de Hebreus 11, as Escrituras dão testemunho de que foram “homens dos quais o mundo não era digno” (v. 38). Sobre Jonathan Edwards se disse que era:

“Uma estrela de primeira magnitude na história da Igreja de Deus” – S. M. Houghton.

“A figura de mais influência no cristianismo norte-americano até o século XX – e possivelmente até hoje” – Meic Pearse.

“Edwards tem a capacidade permanente de falar através das eras” – Harry S. Stout.

Por esses fatos fica claro que a vida de Jonathan Edwards é digna de nosso estudo e imitação.

Quando lemos os nomes da galeria de Hebreus 11 podemos perguntar: O que fez daqueles homens e mulheres pessoas tão especiais? Por que foram tão marcantes no seu tempo e deixaram seus nomes gravados na história da humanidade? O capítulo deixa claro que, no caso deles, a fé foi o diferencial.

Algumas perguntas precisam ser respondidas também a respeito de Jonathan Edwards: O que tornou Jonathan Edwards um homem tão notável assim? O que fez com que esse homem fosse usado por Deus de forma tão eficaz?

Família. Jonathan Edwards nasceu em 5 de outubro de 1703, era filho de um pastor, e nasceu em uma família de 11 filhos: dez mulheres e apenas ele de homem. Era uma das mais respeitadas famílias da América colonial. O pai dele foi pastor na mesma igreja durante mais de 60 anos. O avô de Jonathan Edwards, pai de sua mãe, também pastoreou a mesma igreja por quase 60 anos. Foi no seu lar que Jonathan Edwards recebeu as primeiras instruções que o tornariam um crente diferenciado em sua geração.

Preparação. Foi o próprio pai de Jonathan Edwards que lhe preparou para o ministério, ensinando a ele as Escrituras, o Breve Catecismo e a Teologia Reformada. Foi do pai que Jonathan Edwards recebeu, pela primeira vez, uma apresentação a respeito da vida cristã e das responsabilidades do ministério pastoral.

Conversão. Embora tenha recebido grandes influências da família, a experiência de conversão de Edwards só aconteceu aos 17 anos. Ele estava lendo 1 Timóteo 1. 17. Enquanto lia esse texto bíblico ele escreveu: “Veio à minha alma, como se estivesse espalhando-se nela, um senso da glória do Ser Divino; um novo senso, totalmente diferente de qualquer coisa que eu já havia experimentado antes”. Naquele instante, Edwards foi profundamente impactado e seu coração foi tocado com pensamentos arrebatadores sobre Deus.

Pouco antes de concluir seu mestrado Jonathan Edwards foi convidado a trabalhar em uma pequena igreja presbiteriana de Nova Iorque. Ali sentiu o que chamou de “um forte desejo de ser, em tudo, um cristão completo”. Nesse tempo Edwards estava concluindo o seu mestrado. Ele tinha 18 anos.

Edwards passou, então, a pensar cuidadosamente nas prioridades que ele desejava que fossem os princípios orientadores de sua vida. Foi nesta época que ele começou a escrever as suas “Resoluções”. Edwards redigiu 70 propósitos, todos eles destinados a dirigir sua jornada como crente. Essas Resoluções eram as diretrizes, uma espécie de sistema de controle que ele usaria para projetar toda a sua vida como crente, seus relacionamentos, seu falar, seus desejos, suas atividades.

Edwards conseguiu combinar, de modo singular, a piedade espiritual com um gênio intelectual. Tanto sua mente, quanto seu coração estavam engajados na busca por Deus. A respeito dele disse: Martin Lloyd-Jones: “Edwards era dominado por Deus”.

Pode-se dizer que o grande diferencial na vida de Jonathan Edwards era o seu incansável zelo pela glória de Deus. Ele foi reconhecido em seus dias e até os dias de hoje devido a sua “profunda e excepcional espiritualidade”. A sua alma era dedicada à busca da incomparável honra de Deus.

Uma palavra que poderia resumir a vida de Jonathan Edwards seria: RESOLUÇÃO. Ele era resoluto (decidido). Ele era determinado a viver com total fidelidade a Deus, por amor à grandeza de Deus. A respeito dele se diz que “sua visão era singular; sua alma, constante; seu desejo, firme”.

Jonathan Edwards morreu em 22 de março de 1758. Ele era um crente pessoal e singularmente concentrado em um grande objetivo de vida: viver toda a sua vida para a glória de Deus. Ele dedicava-se plenamente a honrar ao Senhor em cada área de sua vida e o fazia com uma firme determinação. Por isso fez tanta diferença em seu tempo e seu testemunho ecoa até aos dias de hoje.

Agnaldo Silva Mariano



* Boa parte deste texto é uma adaptação do excelente livro: "A Firmes Resoluções de Jonathan Edwards", de Steven J. Lawson, publicado pela Editora Fiel.

quinta-feira, 7 de julho de 2011

DA PREDESTINAÇÃO DE DEUS E DA ELEIÇÃO DOS SANTOS

Deus nos elegeu pela graça. Deus, desde a eternidade, livremente e movido apenas pela sua graça, sem qualquer respeito humano, predestinou ou elegeu os santos que ele quer salvar em Cristo, segundo a palavra do apóstolo: “Ele nos escolheu nele antes da fundação do mundo” (Ef 1.4); e de novo: “... que nos salvou, e nos chamou com santa vocação; não segundo as nossas obras, mas conforme a sua própria determinação e graça que nos foi dada em Cristo Jesus antes dos tempos eternos, e manifestada agora pelo aparecimento de nosso Salvador Cristo Jesus” (2 Tm 1.9-10).

Somos eleitos ou predestinados em Cristo. Portanto, não foi sem medo, embora não por qualquer mérito nosso, mas em Cristo e por causa de Cristo que Deus nos elegeu, para que aqueles que agora se encontram enxertados em Cristo pela fé também sejam eleitos, mas sejam rejeitados aqueles que estão fora de Cristo, segundo a palavra do apóstolo: “Examinai-vos a vós mesmos se realmente estais na fé; provai-vos a vós mesmos. Ou não reconheceis que Jesus Cristo está em vós? Se não é que já estais reprovados” (2 Co 13.5).

Somos eleitos para um fim determinado. Finalmente, os santos são eleitos em Cristo por Deus para um fim determinado, que o apóstolo esclarece, quando diz: “Ele nos escolheu nele antes da fundação do mundo, para sermos santos e irrepreensíveis perante ele; e em amor nos predestinou para ele, para a adoção de filhos, por meio de Jesus Cristo... para o louvor da glória de sua graça” (Ef 1.4-6).

Devemos bem esperar acerca de todos. E, embora Deus conheça os que são seus, e nalgum lugar se faça menção do reduzido número dos eleitos, devemos, contudo, bem esperar acerca de todos, e não julgar apressadamente nenhum homem como rejeitado. São Paulo diz aos filipenses: “Dou graças ao meu Deus por tudo que recordo de vós” (ora, ele fala de toda a Igreja dos filipenses), “pela vossa cooperação no Evangelho... Estou plenamente certo de que aquele que começou boa obra em vós há de completá-la até o dia de Cristo Jesus” (Fp 1.3-7).

Sobre se são poucos os eleitos. E, quando perguntaram ao Senhor se eram poucos os que seriam salvos, ele não respondeu que poucos ou muitos seriam salvos ou condenados, mas antes exortou todo homem a “esforçar-se por entrar pela porta estreita” (Lc 13.24). É como se dissesse: “Não vos compete inquirir com muita curiosidade acerca dessas questões, mas antes esforçar-vos por entrar no céu pelo caminho estreito”.

O que deve ser condenado nesse caso. Por isso, não aprovamos as afirmações ímpias de alguns que dizem: “Poucos são os eleitos, e, como eu não sei se estou no número desses poucos, não me privarei dos prazeres”. Outros dizem: “Se sou predestinado ou eleito por Deus, nada me impedirá da salvação, já certamente determinada, seja o que for que eu fizer. Mas, se estou no número dos rejeitados, nenhuma fé ou arrependimento poderá valer-me, visto que a determinação de Deus não pode ser mudada. Portanto, todas as doutrinas e advertências são inúteis”. Mas o ensino do apóstolo contradiz estes homens: “O servo do Senhor deve ser apto para instruir... disciplinando com mansidão os que se opõem, na expectativa de que Deus lhes conceda não só o arrependimento ... livrando-se eles dos laços do diabo, tendo sido feitos cativos por ele, para cumprirem a sua vontade” (2 Tm 2.24-26).

As admoestações não são inúteis pelo fato de a salvação vir da eleição. Santo Agostinho também mostra que devem ser pregadas tanto a graça da livre eleição e predestinação como também as admoestações e doutrinas da salvação (De Bono Perseverantiae, cap. 14 ss),

Se somos eleitos. Condenamos, portanto, aqueles que, fora de Cristo, perguntam se são eleitos, e o que sobre eles decretou Deus antes de toda a eternidade, pois deve ser ouvida a pregação do Evangelho e deve-se crer nele, e deve-se ter como fora de dúvida que, se alguém crê e está em Cristo, é eleito. Com efeito, o Pai nos revelou em Cristo o eterno propósito da sua predestinação, como ainda há pouco expus, pelo que diz o apóstolo, em 2 Tim 1.9-10. Deve-se, pois, ensinar e antes de tudo considerar quão grande amor do Pai para conosco nos foi revelado em Cristo. Devemos ouvir o que o próprio Senhor diariamente nos prega no Evangelho, como ele nos chama e diz: “Vinde a mim todos os que estais cansados e sobrecarregados, e eu vos aliviarei” (Mt 11.28); “Deus amou o mundo de tal maneira que deu o seu Filho Unigênito, para que todo o que nele crê não pereça, mas tenha a vida eterna” (Jo 3.16). E ainda: “Não é a vontade de vosso Pai celeste que pereça um só destes pequeninos” (Mt 18.14).

Seja, pois, Cristo o espelho, no qual contemplemos a nossa predestinação. Teremos um testemunho bastante claro e seguro de que estamos inscritos no Livro da Vida, se tivermos comunhão com Cristo, e se ele for nosso e nós dele em verdadeira fé.

Tentação sobre a predestinação. Na tentação sobre a predestinação, que é, talvez, mais perigosa do que qualquer outra, console-nos o fato de que as promessas de Deus são universais para os fiéis, pois ele diz: “Pedi, e dar-se-vos-á... Pois todo o que pede recebe” (Lc 11.9-10). É, finalmente, o que pedimos com toda a Igreja de Deus: “Pai nosso que nos céus” (Mt 6.9). Fomos enxertados no corpo de Cristo, pelo batismo, e da sua carne e do seu sangue nos alimentamos freqüentemente em sua Igreja, para a vida eterna. Fortalecidos por essas bênçãos, segundo o preceito de São Paulo recebemos ordem de operar a nossa salvação com temor e tremor.

* Extraído da Segunda Confissão Helvética, elaborada em 1562 por Heinrich Bullinger, publicada em 1566 por Frederico III da Palatina, adotada pelas Igrejas Reformadas da Suíça, França, Escócia, Hungria, Polônia e outras.