Amy Winehouse morreu e foi cremada. Muito já se falou sobre sua vida desregrada e sobre sua morte precoce. Muita gente boa já escreveu bons textos a respeito da cantora inglesa encontrada morta no dia 23 de julho em Londres. Mas é difícil passar sem escrever algo a respeito dela. O Rev. Augustus Nicodemus Lopes escreveu um brilhante texto sobre Amy Winehouse no blog Tempora Mores, onde diz que “Aos 27 anos, Amy chegou ao fim de uma vida atribulada, marcada por escândalos, internações, sofrimento, fama, riquezas e popularidade”. Um fim previsível, diga-se de passagem.
A vida curta de Amy Winehouse parece ter sido vivida no anseio pela morte, como diz a canção Posmortem, da banda americana de thrash-metal Slayer: “O desejo pela morte é a sua razão de viver”. Outro trecho da canção diz: “Você quer morrer!!!”. Amy parecia querer mesmo. E conseguiu.
A morte anunciada de Amy Winehouse fez com que muitas pessoas se lembrassem de outros artistas que perderam a vida precocemente, vítimas de seus próprios abusos e exageros. Muitos se lembraram de Kurt Cobain, vocalista da banda americana Nirvana, morto em 1994; de Jimi Hendrix, morto em 1970; de Janis Joplin, também morta em 1970, entre outros artistas que perderam a vida precocemente, no auge da carreira, especialmente, por causa de abuso de drogas.
Ao tomar conhecimento da morte de Amy Winehouse, sinceramente, não me lembrei de nenhum desses artistas, até porque não conheço nenhuma das canções deles. Na verdade, me lembrei de Desiderius Erasmus Roterodamus, ou, simplesmente, Erasmo de Roterdã, teólogo neerlandês que viveu entre os séculos 15 e 16. Erasmo escreveu, entre outras obras, “O Elogio da Loucura”. Tive o prazer de ler esta obra há alguns anos e pude reviver parte da leitura nestes últimos dias. Principalmente para refletir sobre Amy Winehouse.
Amy Winehouse foi uma filha rebelde, uma jovem sem limites que desde os 17 anos já consumia drogas. Tornou-se viciada em álcool, foi presa várias vezes devido aos seus excessos, namorava um sujeito também viciado e dono de uma extensa ficha policial, e freqüentemente aparecia bêbada em seus shows; enfim, Amy Winehouse era um péssimo exemplo para qualquer jovem. Seu comportamento depravado deveria ser motivo para que as pessoas rejeitassem qualquer influência sua. Mas, ao contrário disto, Amy Winehouse acumulou fãs em todo o mundo e seu estilo de vida ditou moda e se tornou, para muitos, regra de conduta.
Erasmo de Roterdã morreu em 1536, aos 70 anos de idade. Viveu duas vezes e meia a vida de Amy Winehouse. O suficiente para questionar o por que de tantas pessoas aprovarem o que é reprovável, imitarem o que é vergonhoso e amarem o que deveria ser detestável. Em seu “Elogio da loucura”, Erasmo traduz um pouco da inquietação que a admiração que Amy Winehouse conquistou, a despeito de sua vida dissoluta, produz na mente de quem não quer se conformar a esses padrões distorcidos: “Quanto menos talento possuem, tanto mais orgulho, vaidade e arrogância têm. Todos esses loucos, entretanto, encontram outros loucos que os aplaudem, pois, quanto mais uma coisa contraria o bom senso, tanto maior o número de admiradores que atrai; o que existe de pior é sempre o que lisonjeia o maior número; e nada é mais natural, pois, como já vo-lo disse, a maior parte dos homens são loucos. Ora, visto que os artistas mais ignorantes estão sempre contentes com a sua pequenina pessoa e gozam da admiração do maior número, errariam, e muito, se se dessem a trabalhos enormes para adquirir verdadeiro talento o qual não serviria, afinal, senão para fazer desvanecer a vantajosa idéia que eles têm do seu próprio mérito, para torná-los mais modestos, para diminuir grandemente o número dos seus admiradores”.
Agnaldo Silva Mariano
Um comentário:
Nós lemos o mesmo livro? Porque o livro que li, o Erasmo de Roterdã defende que esta loucura é parte essencial do ser humano. Aliás, ele defende claramente que aquele que não se comporta às vezes como as pessoas no trecho que você citou são mais loucas ainda. Loucas porque têm uma vida sem sentido.
Está lá, é só ler. De acordo com Erasmo, a loucura da Amy é melhor do que a loucura daqueles que abrem mão de uma vida feliz, ou que pelo busca a felicidade.
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