
De acordo com a canção, a força necessária para vencer e “conquistar o impossível” vem “de dentro de você”, ou seja, está dentro de cada um. Todos nós temos uma capacidade intrínseca de conquistar tudo o que quisermos. Basta apenas acionar o dispositivo para que essa força funcione. E o dispositivo se chama “fé”. Ela é suficiente para fazer qualquer coisa, pois “você pode até tocar o céu, se crer”. Mas crer em quem? Ou melhor: em que?
A letra da canção não deixa claro qual é o alvo dessa “fé”. Mas pelo contexto dá para entender que é um tipo de fé na própria fé. Não é fé em Deus, pois Deus não faz nada a não ser dar asas. O vôo é por conta do homem. Assim, conforme a música, se o homem tiver fé de que pode voar, voará. Afinal, campeão, a “fé que te faz imbatível mostra o teu valor”.
A fé ensinada na canção não mostra o valor do Deus que dá asas, mas o valor de quem acreditou e voou por sua própria capacidade. Toda a letra da música é uma exaltação da fé humana como recurso único para as conquistas, um tipo de glorificação do homem como ser capaz de fazer o que quiser pela sua própria capacidade de crer. A música é altamente antropocêntrica, ou seja, tudo nela gira em torno do homem e sua capacidade: “Tantos recordes VOCÊ pode quebrar. As barreiras VOCÊ pode ultrapassar”.
Essa música até poderia ser cantada numa convenção para vendedores, na abertura dos jogos olímpicos ou na preleção de um time de várzea, mas nunca num culto, pois ela não glorifica a Deus, e sim, o homem. É uma música contaminada pelo fermento do antropocentrismo. Comparemos essa música com os cânticos bíblicos e não sobrará nada. Os cânticos bíblicos exaltam a Deus e sua glória, e submetem o homem à força de Deus; não ensinam a confiança na capacidade humana, nem atribuem à força do homem a suficiência em nenhum projeto. Essa teologia “Lua de Cristal” de que “tudo pode ser, basta acreditar” não encontra base na teologia bíblica.
O fermento do antropocentrismo contamina a música evangélica produzindo uma igreja incapaz de prestar a Deus um culto aceitável. Uma igreja cuja expressão de adoração está contaminada pelo fermento do antropocentrismo presta um falso culto onde Deus não está no centro, e onde as pessoas não são levadas a considerar e refletir a respeito da sua incapacidade e urgente necessidade de Cristo não como incentivador de conquistas, mas como Salvador e Senhor.
A letra dessa canção mostra outro fermento perigoso que tem influenciado a música evangélica: o triunfalismo: “Campeão, vencedor, essa fé que te faz imbatível, mostra o seu valor”. O trinfalismo é uma falsa interpretação da verdade bíblica a respeito da vitória que os crentes alcançam em Cristo. A Bíblia ensina que os crentes são mais que vencedores através de Cristo Jesus, e somente através dele. Cristo é o vencedor, e aqueles que nele crêem alcançam a vitória por intermédio dele. Mas a Bíblia não indica que essa vitória isenta os crentes dos sofrimentos, perdas momentâneas e imprevistos na vida. Mesmo que sejamos, na linguagem bíblica, mais que vencedores, continuamos humanos e sujeitos às circunstâncias da vida, que muitas vezes nos surpreendem e fazem-nos reconhecer que não somos imbatíveis.
Ao contrário disso, o triunfalismo ensina que o homem é imbatível, e que nada é impossível ao homem que tem fé. Esse, todavia, não é o ensino da Bíblia. O apóstolo Paulo era um homem de fé, mas ele mesmo declarou: “Somos... abatidos...” (2 Co. 4. 9). Ele passou por muitos momentos em que viu suas orações não serem atendidas, sonhos não serem realizados, projetos não serem alcançados e dificuldades maiores que os recursos disponíveis impedirem algum sucesso. Paulo era um homem crente, fiel a Deus, mas não pregou nenhum tipo de triunfalismo. Nunca saiu de seus lábios nem de suas cartas nenhum ensino de que o crente sempre ganha as batalhas desta vida e de que o crente seja imbatível. Ao contrário do triunfalismo, a Bíblia ensina que para o homem, por mais crente que ele seja, há muitos impossíveis; mas nada é impossível para Deus. A Bíblia não garante que tudo o que o que o crente quiser ou desejar vai acontecer. A certeza, a confiança ou a fé do crente não garantem que tudo vai dar certo, que ele vai vencer todas aqui na terra. Às vezes o crente se sentirá abatido, entristecido, derrotado, mas a certeza dele é que Cristo venceu todas as batalhas e que sua vitória final só será alcançada na eternidade, não aqui.
Outro fermento perigoso presente nessa canção é o fermento da auto-ajuda. Muitas canções que ouvimos hoje em dia nas igrejas são meros discursos para elevar a auto-estima do homem. São cânticos motivacionais, não verdadeiro louvor a Deus. “Acredite. Nossos sonhos a gente é que constrói”; “Você tem valor”! As pessoas ouvem essas canções para sentir-se bem consigo mesmas, elevadas, estimuladas. Essas mensagens não causam impacto na consciência quanto ao pecado, mas despertam as emoções e produzem uma falsa sensação de bem-estar. É isto que faz as pessoas freqüentarem por anos a fio as igrejas e nunca se converterem; afinal, elas nunca ouvem que são pecadoras e precisam de arrependimento. Ao contrário, ouvem sempre que precisam sonhar e correr atrás dos sonhos, que tudo vai dar certo, que têm valor, e que podem até tocar o céu pela força do pensamento positivo, falsamente chamado de “fé”.
A canção “Conquistando o impossível” é apenas um triste exemplo do que tem se tornado comum no repertório gospel. O fermento que contamina a música cantada por boa parte de nossas igrejas tem prejudicado de maneira significativa a qualidade do testemunho cristão em nossos dias. São canções que não glorificam a Deus, mas exaltam o homem; muitas não falam de pecado e arrependimento, mas prometem a possibilidade de “até tocar o céu” sem passar pela cruz. São mensagens superficiais, produzidas para agradar o gosto do mercado, e não para promover a glória de Deus e o conhecimento dele que leve o homem à Salvação por meio de Cristo Jesus. Ao sabor das conveniências, tais canções estimulam um falso cristianismo e enganam os perdidos, oferecendo-lhes uma falsa esperança de que tudo está bem. É preciso resistir a esse perigoso fermento, antes que ele levede totalmente a maneira de crer da Igreja do nosso tempo.